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Política,sociedade e cultura.Para resumir em três tópicos seriam estes os temas pelos quais queremos sempre gerar uma polêmica ou expor nossos pensamentos.Todavia, no blog também há espaço para as coisas do coração,da alma e da vida que enxergamos de maneira peculiar e reagimos de maneira muito mais ímpar ainda.Aqui está aberto o espaço para nossas idiossincrasias.Boa leitura

sexta-feira, setembro 29, 2006

A morte da soberania


(*) Luiz Elias Miranda

Retorno a vocês meus caros amigos depois de certo recesso mas, estou eu cá novamente. Deixemos então de “conversa mole” e vamos ao que interessa. Venho hoje falar de um grande problema na política de nossos dias: o desaparecimento (ou transformação) do conceito de soberania.

Soberania e Estado sempre foram termos que estiveram intimamente correlacionados, a própria escola dita ‘clássica’ da teoria do Estado lista a soberania como um dos componentes essenciais do Estado (juntamente aos itens população, território e governo).

Um conceito simplificado de soberania é uma tarefa de certa forma complexa, Paulo Bonavides define a soberania como “o poder do Estado que se sobreponha incontrastavelmente aos demais poderes sociais que, que lhe ficam subordinados(1). Em termos mais simples, a soberania seria o poder de o ente estatal sobrepor sua vontade sobre a vontade das demais forças sociais, a soberania teria, segundo a mais clássica doutrina do Estado, duas dimensões, uma interna e outra externa, é sobre esta segunda dimensão da soberania que concentrarei minha reflexão.

Por um grande período de tempo (coisa de 500 ou 600 anos) Estado e soberania foram idéias quase que inseparáveis, a soberania foi um poder essencial para a formação dos Estados nacionais europeus no fim do século XIV e um conceito essencial em todos os fatos acontecidos durante toda idade moderna. Entretanto, a partir do final de século XIX isso tudo começa a mudar.

A unificação alemã e italiana – que, na prática, implicou na renúncia de soberania por parte dos Estados que formaram a nova Itália e nova Alemanha – começa esta mudança da idéia do que seria soberania, a teoria do Estado clássica sempre remetia ao conceito como algo “irrenunciável” e “inalienável”, estas modificações no mapa da Europa em menos de cinqüenta anos provam que a doutrina do Estado mais abalizada não estava tão correta assim.

Após o século XX (principalmente a sua primeira metade) a soberania nunca mais poderia ser a mesma. O fim da II guerra mundial (1939-1945) é a mais lúcida demonstração do fim da soberania estatal em seu caráter externo. A guerra desencadeada pelo nacional-socialismo alemão e pelo fascismo italiano trouxe grandes perdas para o mundo, principalmente quando se fala em “material humano”, os países vencedores tomaram digamos que medidas extremas para tentar resolver de uma vez por todas os problemas europeus e fazer com que aquele inferno nunca mais acontecesse aqui na terra. Vejo as medidas geradas do fim da guerra que levaram ao ocaso a soberania, podem ser pensadas da seguinte forma, o militar estadunidense general Sherman (1820-1891) certa vez, durante a guerra de secessão dos Estados Unidos, afirmou que a “guerra é o inferno” (the war is hell, hell on earth), então, para dar fim a este inferno na terra, para sair daquele inferno, todo qualquer recurso seria válido, não importaria sua justeza, não importam as conseqüências.

Mas, voltando ao assunto principal, as medidas tomadas pelos aliados contra a Alemanha marcam em si a morte definitiva da soberania em nossos tempos, na medida em que os aliados dividem um Estado – antes livre e soberano – em quatro zonas de influência, determinam certas restrições ao povo alemão e impõem o pagamento de pesadas indenizações para reparar os males trazidos pela guerra por eles iniciada, podemos observar que a soberania não é assim um conceito tão absoluto, um poder tão incontrastável, ao contrário, ela seria uma característica que poderia dos países ser arrancado, algo renunciável.

Após a guerra, esta situação apenas será agravada pela formação de uma das instituições mais sólidas dos últimos tempos, a União Européia.

A União Européia remonta a um antigo sonho e obsessão de alguns pensadores, o renascimento daquilo que poderíamos chamar de “super-Estado”, a UE é materialização daquilo que Carl Schmitt (1888-1985) denominava de Großbaum (“o grande espaço”), esta formação político-econômica, taxada como exemplo por todos os países do globo é a definitiva sentença de morte do caráter soberano dos Estados em nossa época.

A idéia de uma mega-Estado europeu sempre existiu, desde o fim do império romano várias foram as tentativas de cunhar novamente um Estado gigante dentro da Europa que fundisse várias culturas dentro de um mesmo território. A idéia mais primitiva desta vontade de unificação do velho mundo ressurge num discurso proferido pelo primeiro-ministro britânico Wiston Churchill na Universidade de Zurich em 1946(2), onde ele ressalta a necessidade da formação de um verdadeiro “Estados Unidos da Europa”.

Visto a necessidade política e econômica da atualidade, a União Européia não tem nada de má ou de maligna, mas ela encontram-se nefastas conseqüências para a soberania – que já foi vista em outros tempos como um verdadeiro dogma .

A renúncia ao poder soberano (3) é um ato essencial para entrar no anteriormente citado bloco, em linhas gerais, o fim da soberania e todas as outras características dela advindas é essencial para a compreensão da modernidade, encaro o novo milênio como o início da era da “soberania morta”, para quê ela ainda é necessária se não é mais é vantajosa sua existência?


*Para Diara, com muito carinho...

(*) Luiz Elias é estudante de direito pela UEPB.

(1)BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. São Paulo: Malheiros, 10ª edição, 1998, p. 122.

(2)Discurso este disponível em: http://www.coe.int/t/pt/com/About_CoE/POR_disc_Churchill.asp

(3)Podemos interpretar a submissão à corte européia de justiça claramente como uma renúncia direta ao poder soberano.