:::Fantoches nunca mais::: "Alea jacta est!"

Política,sociedade e cultura.Para resumir em três tópicos seriam estes os temas pelos quais queremos sempre gerar uma polêmica ou expor nossos pensamentos.Todavia, no blog também há espaço para as coisas do coração,da alma e da vida que enxergamos de maneira peculiar e reagimos de maneira muito mais ímpar ainda.Aqui está aberto o espaço para nossas idiossincrasias.Boa leitura

sexta-feira, março 03, 2006

Vertigem

(*)Ana Adelaide


Os Armoriais que me perdoem, mas o Rock é fundamental! E foi continuando o final de semana vertiginoso, ainda com os acordes de Brown Sugar na cabeça que me deparo com o grupo Irlandês de rock-humanista-politicamente correto U2.
A Irlanda é um país que me fascina; pela natureza, pela oralidade, pelos Celtas, pelo mar, pelas danças, pelos filmes (especial para Traídos pelo Desejo-The crying Games, ou Em Nome de Deus), pela literatura (Joyce, Beckett, Wilde, Yeats, Ângela Bourke, Éilís Ní Dhuibhne), pela música de Enya e agora pelo canto de Bono Vox.
No seu livro, A Angústia da Influência, Harold Bloom fala do Mito do abismo, e da nossa consciência não da Queda, mas de que estamos caindo , e caindo de nós mesmos. E que quando essa consciência do eu é elevada a um pico absoluto, então o poeta bate no chão do Inferno, ou melhor, chega ao fundo de um abismo...”. Mas o abismo do U2 com certeza está mais para uma vertigem não no sentido de perder-se em si mesmo, mas no resistir aos impasses dos novos sujeitos identitários, desse nosso “admirável mundo novo” de tantas desigualdades e sofrimento. Bloom também afirma que, “todo bom leitor deseja afogar-se” . Pois na noite de segunda feira passada, com uma xícara de café extra forte e uns biscoitinhos para espantar o sono, caí e levei altos tombos nos labirintos de mim mesma; deixei-me inundar-me por Sunday Bloody Sunday, Miss Sarayevo, One, e claro, Vertigo para todos os lados.
Que espetáculo o show dos Dublinenses! E que mis-en-scene! Pacifista, bandeiras do mundo inteiro, Brasil Lindo, Copa do mundo, Ronaldo, COEXISTA, Não à intolerância religiosa, Elevation, o menino de Caruaru que com uma pronúncia Vitalina tentava- “This is the time”! Ou a sortuda que teve Bono ajoelhado literalmente à seus pés entoando uma canção de amor. Todas as sensações na minha vertigem particular ao ver 70 mil pessoas entoando as baladas se não de Galway, mas de uma Irlanda moderna e com tecnologia de ponta, que de nada lembravam o filme “As cinzas de Ângela” ou A grande Fome do passado, que ocasionou o êxodo dos Irlandenses mundo afora, à espera de um Godot mais fértil e de vida menos sangrenta.
Fico sempre em estado de êxtase ao imaginar a sensação que pode ter uma pessoa no palco, sendo aclamada por mil/milhões de fãs a se acotovelarem e cantarem a música do artista, numa língua que não a sua, O jogador de futebol Raí, ao caminhar pelos salões da área Vip, foi indagado se seria como fazer um gol em final de copa do mundo. E ele humildemente respondeu de pronto: Mas esses caras fazem gol em final de copa do mundo toda a hora! Pois é isso, uma turnê por pelo menos 19 países (no caso do U2), é muito gol para uma só pessoa, que com seu chapéu de cowboy e seus óculos pink-verde-bandeira-do-Brasil, revolve o nosso sentimento tribal de pertencimento, quando o próprio Bono, entoa os batuques de um tambor solitário, num palco lá no meio da multidão, próximo se não da humanidade, pelo menos de um cantinho do céu.
E nesse caldeirão de sons, depois do rock, vieram as picadas das Muriçocas do Miramar e a celebração dos 20 anos do bloco. Neste carnaval, uma outra vertigem, mas dessa vez para dentro de casa, sem antes no entanto, passar pelos cowboys de Brokeback Mountain e pelas Gueixas do cinema. Mas aí é assunto para outra crônica.